sábado, 23 de abril de 2011

Quando olhar incomoda

As ruas de pedrinhas, perto do aeroporto, anunciavam uma cidade ao menos charmosa. Era só ilusão. A cada esquina que o carro dobrava via-se prédios com pinturas descascadas e cerâmicas caindo do céu. As casas se amontoavam: paredes coladas, puxadinhos de todos os lados, tijolos a vista. As plantas nos canteiros centrais e nos jardins particulares - com algumas exceções - muito mal cuidadas. Dos postes, fios e mais fios saíam de todos os lugares. Antes que algum detalhe prenda sua atenção, não se engane. Turista: Ilhéus é um erro.


(Cabaré Bataclan, imortalizado nos livros de Jorge Amado. Tentei de todas as formas tirar uma foto sem pegar os fios elétricos. Não deu)

Durante a semana que passei na Costa do Cacau, dormi na cidade todos os dias. Respirava sua maresia e apreciava suas paisagens da janela da minha pousada na beira da Praia da Avenida. Sempre que ia a outro município passava no centro da cidade e via sua ruas, sua população e todos os seus hábitos. Era sempre um alívio sair dali.

O descaso da população, e principalmente do governo, é visível. A impressão que dá é que não há plano diretor ou leis sobre a construção de imóveis. Seja no centro ou nas rodovias que levam às praias, a cidade é uma grande bagunça. Olhar incomoda.

Na hora errada

Antes da vassoura-de-bruxa infestar as plantações da região, Ilhéus foi a cidade com a maior produção de cacau do mundo. Rica e bem desenvolvida, era conhecida como a "Princesinha do Sul". Quem morava ali tinha dinheiro e classe. Os fazendeiros eram cultos e seus filhos iam estudar nos grandes centros urbanos do Brasil ou mesmo no exterior. No convento e igreja Nossa Senhora da Piedade vi algumas fotos dessa época. A cidade era belíssima! Tinha praças largas, jardins bem cuidados e construções organizadas.


(Nesse site, uma ideia da Ilhéus dos anos 1950)

Ilhéus ainda é relativamente rica. Possui o 6º maior PIB do estado da Bahia, com uma economia baseada em turismo, agricultura e indústria. Mas a cidade que eu vi está a anos-luz de distância daquela que Jorge Amado relata nos livros Terras do Sem-fim, São Jorge de Ilhéus e o famoso Gabriela, Cravo e Canela. A Ilhéus pela qual ele se apaixonou era aquela que vi nas fotos em preto em branco, nas paredes do convento.

O que sobra

Mas algo de interessante Ilhéus deve ter para que o turismo seja uma de suas fontes de renda. Sim. Não é preciso tirá-la do roteiro, mas algumas pontos devem ser destacados:

Regra nº 1: não se hospede no centro

Tudo o que disse sobre Ilhéus se restringe ao centro da cidade, aquela parte cheia de comércio e movimento. O problema é que é que Ilhéus toda parece um grande centro. Não há bairros residenciais bonitos ou uma região histórica separada. Assim, a solução é se hospedar nas praias afastadas da área urbana.


(Mesmo as praias urbanas podem dar belos visuais. O mesmo acontece com os monumentos, como a Igreja Matriz de São Jorge dos Ilhéus. Quando bem cuidadas, são um colírio para os olhos)

Regra nº2: cuidado com as fotos

Um dos motivos que nos fazem escolher uma cidade como roteiro turístico potencial é as imagens do lugar. A internet está cheia de belas imagens, como no site Brasilhéus e Férias Brasil. Mas todos sabem que hoje até o Microsoft Office é capaz de corrigir imperfeições. Não peço incredulidade total, mas um pouco de noção (o que nos leva para a 3ª regra, algo a ser seguida em TODAS as viagens)

Regra nº3: não espere demais

A maior parte das pessoas cai em duas armadilhas. Uma delas é esperar a Ilhéus dos anos 50. Atenção, ela não existe. A outra é se encantar com os relatos de quem foi para ficar em algum resort. Eu cai nas duas, principalmente na segunda. Tenho amigos que já foram para a cidade e voltaram contando maravilhas. Hotéis cinco estrelas são sempre hotéis cinco estrelas: é difícil dar errado.

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