sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Chuvosa Sevilha

Dessa vez não acordei com um raio de sol batendo no meu rosto. Muito pelo contrário. Quando o despertador tocou, olhei para a janela e vi o céu cheio de nuvens cinzas. Fiquei uns cinco minutos deitada na cama, entre a preguiça de me levantar e a tristeza de ver o dia nublado. As ruas estavam molhadas, então torci para que toda a chuva já tivesse caído.

(A chuva vista do alto da Giralda para o patio de las Naranjas, dentro da Catedral da cidade)

Acordamos tarde por causa da farra do dia anterior e resolvemos pular o café da manhã. Fomos de novo ao La Taberna comer as deliciosas patatas bravas. Talvez por causa da chuva ou do horário - 13h ainda é cedo demais para almoçar nos critérios espanhóis - o local estava tranquilo. Pegamos uma mesa perto do balcão e enchemos a pança antes de turistar por Sevilha.

Conversando sobre a programação do dia, percebemos a sorte de ter visitado tantas coisas no dia anterior. Fomos à praças, bairros típicos e vimos uma infinidade de monumentos históricos ao passear pelas ruas da cidade. Por algum motivo não entramos em museus ou igrejas, passeios ideais para aquele dia de chuva.

(Porta do Palácio de Pedro I, um dos edifícios do Real Alcázar)

Começamos então pelo Real Alcazár de Sevilla, um conjunto de edifícios palacianos rodeados por uma muralha no centro da cidade. Do lado de fora não parecia tão deslumbrante e ficamos na dúvida sobre entrar ou não por causa do preço. Nosso amigo aconselhou: "como quiserem, mas se eu tivesse que levar um estrangeiro para visitar um único lugar da minha cidade eu o traria aqui". Fomos conquistados por uma frase e resolvemos entrar de qualquer forma. Estava com os 7 euros na mão quando o guarda disse que estudantes da União Europeia não pagavam. Entrei, de graça, e percebi que se tivesse pago pela visita ela ainda assim valeria todos os meus centavos.

O enorme Real Alcázar começou a tomar forma no ano de 720, quando os árabes tomaram a cidade e passaram a usar o local como residência dos seus dirigentes. O local foi se ampliando a cada ano e ganhando novas edificações, como o Palácio da Bendição e o Alcázar. Para a construção e ornamentação eram chamados artesãos locais e também das cidades de Toledo, Granada e outras. A arquitetura islâmica está em todos os lugares e pode ser facilmente notada nos domos circulares cuidadosamente pintados e nos arabescos que permeiam as colunas e paredes de grande parte das salas do local.


(Uma das passagens do Palácio, com detalhes em laranja, verde, azul (e seus mil tons) e mosaico dourado do teto de um dos salões do Real Alcázar)

Em 1248 a cidade passou novamente para mãos espanholas, durante um movimento cristão conhecido como Reconquista. Assim que o Real Alcázar se tornou residência real, o herdeiro do trono Alfonso X iniciou uma série de reformas e construiu três grandes salões em estilo gótico. Mais tarde, no ano de 1364, o rei Pedro I decidiu construir o primeiro palácio castelhano que não estava protegido pelas muralhas de um castelo. O Palácio de Pedro I se constitui no melhor exemplo de arte mudéjar da Espanha, estilo artístico criado na Península Ibérica no qual evidencia-se a mistura de elementos espanhóis e muçulmanos. Mais tarde foram erguidos também a Capela Gótica, o apeadero, o pátio da montaria e as grutas do jardim.

As construções dos povos árabes não são necessariamente bonitas do lado de fora, mas são sempre lindas do lado de dentro, pois acreditam que a riqueza interior vale mais que a exterior e que a beleza deve ser apreciada todos os dias. Era realmente tudo lindo. As paredes de pedra pareciam renda, os azulejos dos corredores formavam enormes mosaicos e os tetos de madeira foram esculpidos de tal forma que pareciam ter sido entrelaçados manualmente.

(O pátio das Donzelas...)

(... e os banhos de María Padilla. Dois locais que não podem deixar de serem visitados)

Dois espaços do palácio me chamaram a atenção. O primeiro é o Pátio das Donzelas. Por ser aberto, no meio há um grande chafariz em forma retangular e algumas plantas. Entre um vaso e outro, pilares que sustentan grande blocos de mármore esculpidos com grande delicadeza. O outro espaço são os Banhos de María de Padilla. Para chegar ao local é preciso sair do espaço coberto, ir até os jardins e então entrar em uma porta que leva a um enorme sótão dividido em 10 partes e cheio de tanques de água cobertos por abóbadas. A iluminação natural deixa o espaço com um tom amarelado, quase surreal.

(Parede de ouro da catedral de Sevilha. Foto tirada desse link)

Demoramos um pouco para sair do Real Alcázar por causa da chuva, mas logo entramos na catedral de Santa Maria da Sede de Sevilha, que não tínhamos entrado no primeiro dia de visita. A maior igreja gótica do mundo parece ainda maior do lado do dentro. O altar principal é enorme e tem uma parede com estátuas e símbolos católicos toda coberta em ouro. Ela apresenta também um série de outros altares e capelas, dedicados a santos e utilizados em momentos diversos que não a missa principal.

Em um dos cantos da catedral está um bloco de mármore coberto por uma tampa de madeira maciça com uma estátua de quatro guardas em vestes católicas carregando um objeto. No canto, um modesto papel onde se lê Mausoleo de Cristóbal Colón e a confirmação de que ali estão os restos mortais do famoso navegante espanhol que descobriu as Américas, no ano de 1492. Curioso é que a confirmação aconteceu somente em 2006, após análise de DNA dos ossos que estão na tumba. Até então, os pesquisadores não sabiam se os ossos de Cristóvão Colombo estavam em Sevilha ou na Catedral de Santo Domingo, na República Dominicana.

(Apesar da pesquisa, ainda existe constrovérsias acerca da autenticidade dos ossos. Foto tirada desse link)

Outra curiosidade é a Giralda, cartão-postal da cidade. Pagamos dois reais para subir até o alto da torre e ter uma das melhores vistas do centro histórico. Pena que ao chegar lá em cima encontramos uma cidade nublada: por causa da neblina, não foi possível ver muito além.

Descemos e começamos a andar a esmo pela cidade. Passamos por restaurantes apetitosos e loja de souvenirs com objetos engraçados. Paramos em um bar no bairro de Triana com vistas para o Guadalquivir, o maior rio da Andaluzia. Percebemos então que o passeio não tinha acabado, pois estávamos de frente para a Torre del Oro, uma torre em forma de dodecágono construída em 1220. O local, que hoje abriga o museu naval da cidade, tem esse nome devido a cor de suas paredes refletidas no rio.

(O brilho dourado da torre se deve a uma mistura de cal, argamassa e palha)

E se a torre estava de um lado, do outro encontrávamos a Ponte Isabel II, mais conhecida como Ponte de Triana. A ponte feita em ferro fundido foi inaugurada em 1852 com um desfile militar, tamanha a alegria da população ao ver, finalmente, uma ponte sólida capaz de ligar as duas partes da cidade.

(Design moderno em ferro fundido. Foto tirada desse link)

Foi com paisagem que nos sentamos para tomar uma cerveja e conversar um pouco antes de ir dormir. Foi com essa paisagem que nos despedimos de Sevilha. Olhei para o céu aparentemente sem nuvens e pensei "amanhã vai fazer sol". Invejei seus moradores e desejei ter mais um dia naquela cidade. Mas o tempo passava e as malas estavam prontas para ir a Barcelona.

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